terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Trabalhar é fácil

Quem está em um ambiente de trabalho que implica em convivência grupal irá compreender melhor esse texto. Essa pessoa sabe que a parte mais desgastante do trabalho não é a tarefa em si, e sim o entorno, as relações que são estabelecidas no espaço laboral.

Poucas pessoas não sabem trabalhar sem competir, sem querer atropelar o outro e impôr seu modo de ver as coisas. Trabalhar em grupo é ter que se explicar a cada minuto, justificar cada ato e cada palavra empregada. Todos são alvo de fofoca. O que se destaca, o que não consegue ter êxito, o mais extrovertido, o que não fala com ninguém. Todo mundo sofre com a língua e o olhar alheio. Equipes onde existe uma torcida constante para que tudo dê errado. Principalmente para os outros. Os sujeitos não se enxergam parte do todo. Não notam que esconder informações e conhecimentos não fará com que cheguem mais rápido aonde desejam estar. É como concurso. Torcer para a desgraça do outro não fará de você o vencedor. Você, antes de tudo, terá que fazer a sua parte. E só a sua parte que decide se você é habilitado ou não.

Reuniões de equipe são a materialização desse tormento. Relacionamento mediado por máscaras e palavras cordiais, crivadas de intenções mesquinhas e estúpidas.

Poucos conseguem fazer a sua tarefa, de modo simples e pacífico. Geralmente fazem mal a sua e atrapalham a do outro.

As discussões não são pautadas pelo mérito da questão, são baseadas em impressões artificiais, que envolvem vaidade, aparência e status. “Tenho que aprovar o meu projeto porque ele é de minha autoria". “Não posso tolerar críticas, nem pensar em enxergar pontos positivos nos meus concorrentes”.

Quase todos já falaram um do outro no trabalho, aqueles que evitam esse costume acabam sendo alvo da fofoca de todos, por vingança.

Não é à toa que os feriados são comemorados como um título mundial, afinal não precisar suportar certas pessoas é uma benção para quem se sente pressionado e desconfortável no dia-a-dia.

É claro que existem lugares onde é possível estabelecer interações francas e sinceras, nas quais o objetivo é superar-se e fazer do trabalho um desafio estimulante e criativo. Porém é bem mais raro.

A maioria se torna muito capaz de executar sua função, só não se torna eficiente em lidar com outros seres humanos. Mas isso deve ser só um detalhe.

domingo, 12 de dezembro de 2010

Individualismo, será ?

Os pensadores do contemporâneo afirmam que vivemos numa sociedade individualista e narcisista. Que somos guiados para a realização de desejos egocentrados e nada além disso. Será mesmo?

Penso bem ao contrário. Porém quem não percebe as sutilezas, realmente se equivoca ao interpretar o que estamos vivendo.

A publicidade e o mercado enviam mensagens de auto-realização, dizem que precisamos ser nós mesmos, temos que correr atrás dos nossos sonhos e viver o ápice do ‘eu tenho, eu sou, eu faço, eu brilho’.

Mas essa é a questão. Para chegar 'nisso' você precisa usar tal roupa, comprar tal produto, adquirir uma atitude, consumir algo.

Essa é a grande estratégia, as pessoas são orientadas para serem iguais, mas com a ilusão de que estão sendo diferentes, exóticas e singulares. A exclusividade está apenas na teoria, para parecer mais aderente e atraente. Concretamente somos clones uns dos outros. Os jovens estão mais expostos a esse processo. Buscam a igualdade, evitando a exclusão, porque é isso que acontece com quem destoa da coletividade.

Nossa sociedade e nossa criação não favorecem os diferentes. Pune quem questiona e investe sua energia em algo criativo e inovador. Claro que depois de algum tempo a invenção se torna aceitável e aquela pessoa se torna ícone de uma geração, mas só depois de ter sofrido muito com o peso de não ser banal.

Os universitários enchem a boca e falam do narcisismo, que somos egoístas e só pensamos no nosso umbigo. Quem dera! Seria ótimo se as pessoas fossem elas mesmas e pensassem em si primeiro. E seria ainda melhor se a sociedade encorajasse os sujeitos a adotarem atitudes espontâneas e coerentes com o que pensam e sentem.

Garanto a você que a sociedade seria mais pacífica e menos agressiva. Cada um respeitaria o ponto de vista de outro porque se teria a consciência de que a diferença de fato existe. Não almejaríamos participar de programas televisivos, ganhar fortunas e ter a vida dos famosos e milionários. Teríamos certeza de que estamos no lugar certo com as pessoas certas.

Essa é a uma das grandes frustrações atuais. A maioria pensa que deveria ter mais dinheiro, que deveria estar em um lugar social que ainda não está ocupando. Milhares descontentes com quem são e com o que tem. Por que eu não namoro aquela atriz famosa? Por que não tenho um carro de última geração? Por que não tenho tal rosto? Preste atenção que esse desejo de ser especial é predominantemente externo. E com uma conotação de triunfo sobre o outro. Ser mais que o outro. Quando vamos perceber que somos iguais em valor e que é impossível ser superior a alguém? Queremos ser diferentes de uma maneira perversa e distorcida. Não queremos acrescentar algo ao mundo com o nosso tempêro, queremos anular quem somos de verdade para quem sabe virmos a ser uma pessoa que possa mais que o restante.

Não é por acaso que a vida levada com esses valores é um passo rápido para a depressão e o vazio. Desespero, pânico e medo. Abre-se mão de quem se é e não se alcança o que se quer. Porque o caminho convencionalmente oferecido é para poucos, talvez para nenhum. Mas a gente segue desperdiçando nossos tesouros, aquilo que é nosso e que verdadeiramente nos fará vencedores. Porém vencedores de um jogo sem adversários. Uma batalha onde lutamos para dar o melhor de nós mesmos.

Ah, antes que alguém pense que eu estou falando dos outros. Nem pensar, falo daquilo que enxergo em mim. Faça o mesmo, para variar.

terça-feira, 15 de junho de 2010

Assumir a materialidade - parte 2- Grana ( $)

Vamos tratar de grana. Money. Bufunfa. Cascalho. Pense com carinho nesses questionamentos: você fica incomodado quando perguntam quanto você ganha pelo seu trabalho? Fica envergonhado ao cobrar pelos seus serviços?
Na elucubração, oriunda das perguntas formuladas acima, pode-se chegar à conclusão de que lidar com dinheiro é tão constrangedor quanto apropriar-se da sexualidade e do corpo. Como estou no Brasil, posso encontrar uma explicaçã plausível para nossa vergonha com o dinheiro. Viver em um país onde existem pessoas que não conseguem dinheiro, nem para comer, certamente nos gera grande culpa, no gasto de cada centavo que se ganha diariamente.

“Não acho dinheiro importante”. “Não sou apegado aos valores materiais”. Quem afirma isso passa a impressão de que a matéria não possui relevância alguma para uma vida boa. Bom, não se pode superestimar, porém, diminuir a centralidade da matéria é negar o próprio pulsar da vida. Quando buscamos a espiritualidade, o caminho mais trivial exclui o dinheiro terminantemente dessa jornada. O dinheiro nos deixa sujos, espírito e matéria não se coadunam no senso comum (em outros sensos também). Quem possui muito dinheiro geralmente é alvo de certas afirmações: “Ele tem dinheiro, mas não é feliz”. “Tem dinheiro, mas não dá valor às coisas simples, à natureza.” Pode até ser o caso, algumas vezes, mas generalizar sempre é arriscado.
Foi lendo e refletindo sobre as mensgens de Osho que percebi como poderia encarar esse duelo material x espiritual de uma forma mais produtiva. Ele faz uma analogia, usando, como exemplo, a subida de uma escada, soando, nessa ideia, extremamente infantil (positivamente) e simples. Como chegar no andar mais alto da escada ( espiritualidade) sem começar pelo mais baixo (materialidade)? A materialidade é fundamental no caminho espiritual, por mais contraditório que isso possa parecer. Se as coisas existem, por que não desfrutar? Quem sabe viver a esfera concreta da realidade, visando um patamar mais elevado da existência? O momento em que as possibilidades materiais se esgotam, anuncia-se o nascimento de uma nova etapa. Na medida em que você já comeu tudo o que havia pra comer, consumiu o que havia de ser consumido e teve todas as experiências sensoriais possíveis, um grande vazio irá surgir. Pode-se argumentar que no mundo capitalista esgotar essas possibilidades é impossível, mas é líquido e certo que o ser humano possui um limite em aproveitar a materialidade. Assim como uma criança se entedia com os brinquedos que vai adquirindo, o ser humano maduro também não consegue satisfazer-se totalmente usufruindo apenas do aspecto sensorial. É por isso que o pensador argumenta que é praticamente impossível pensar em elevação do espírito com a barriga roncando. Como pensar em algo além do soma, se ele está incompleto? Usando a (bio) lógica desenvolvida aqui, chega-se a consideração de que os espiritualistas, que buscam abolir o mundo sensorial da experiência transcendental, estão indo para a direção contrária. Quanto mais se nega, mais aparece e grita. Se quero me livrar do sexo, vou usar minhas energias vitais e mentais para me livrar do sexo, e não para alcançar a espiritualidade. Com relação à comida é a mesma coisa. Se evito, não me livro. Só é possível superar algo mergulhando profundamente naquilo, desviando eu só postergo o desafio.

E o que falar das pessoas que tem dinheiro sobrando e não gastam? Não recrimino as pessoas econômicas, porém não consigo deixar de ter pena de quem ganha dinheiro e não o usa. Pessoas que ganham 5 mil reais por mês e não dão gorjeta de 2 reais para o garçom. Seres humanos que freiam a vida. Freiam a si mesmos. Dinheiro é prazer e bem estar. Seja o nosso ou do próximo. Não proporcionar essa alegria é estar morto, permanecer grudado rente ao solo. A morte chega logo, não se engane. De que adianta ir para a estação e não embarcar em nenhum vagão do trem? Não tenho raiva desses tipos. Meu sentimento é pesaroso, ao ver pessoas que podem ser mais felizes, mas escolhem não ser.

O mundo é capitalista, cão. A competição é selvagem. Ganhar dinheiro no Brasil, para a maioria, é um sufoco. Então vamos tratar de aplicar nosso dinheiro suado de forma sábia e alegre, com o mínimo de culpa possível. Isso não é uma ode ao consumismo. No fundo é até o contrário. Se tratarmos a grana com naturalidade, ela vai perdendo a qualidade mitológica e assustadora que muitas vezes aparenta ter para maioria .

domingo, 30 de maio de 2010

Assumir a materialidade (parte 1: do corpo)

Este assunto está relacionado a inúmeros tabus e preconceitos da mente humana. Nem sempre ficamos confortáveis em lidar com o plano material da existência. A matéria esta enraizada no cotidiano, porém isso não significa que somos íntimos de sua devida apropriação e fruição. Vejam o corpo, por exemplo. Poucos são aqueles que possuem consciência e se sentem confortáveis em sua morada biológica. A cultura religiosa tornou o corpo impuro, fonte de pecado e negatividade. O homem da cultura católica não possui corpo, é uma alma que vaga desengonçadamente num soma qualquer. Indo mais adiante, veremos que até algumas ciências- que se dizem liberais e modernas- possuem dificuldades em encarar a materialidade corporal .
Observem o saber psicanalítico. Esse conhecimento se orgulha de ter dado um golpe fundamental na ilusão humana, afirmando que o homem, na verdade, não se conhece de fato. Além dessa premissa, essa teoria desvelou a sexualidade humana, quebrando tabus e gerando muitas transformações culturais com os seus postulados. Essas ideias resultaram em um grande conflito e uma aberta hostilidade da igreja católica em relação a psicanálise. Porém a psicanálise mostrou, por meio da sua evolução histórica, que não conseguiu superar certos tabus em sua prática e teorização. Não quero afirmar que isso a torne menos válida e importante, mas penso ser uma grande lacuna a ser pensada e preenchida. A psicanálise, através de sua metodologia terapêutica, desconsidera o valor do corpo no tratamento. Qual seria a mensagem central da presença do divã na terapia? Você tem um psiquismo, que se revela em palavras (faladas) sem pensamento prévio, mas não possui um corpo, é apenas uma voz que diz. O divã separa corpo e psique, tal como Descartes e a Igreja também fizeram há tempos atrás. Os críticos de plantão podem dizer que isso já é passado, que o divã não existe mais na terapia psicanalítica. Isso até é verdade, mas a teoria construída ainda enxerga o corpo como um fantasma e não como uma realidade. As teorias psicossomáticas atuais tentam disfarçar esse vazio a respeito do soma. Entretanto, atribuem a mente o papel principal na determinação das doenças, sendo que o corpo e a psique não possuem valores iguais. O corpo pode adoecer por sentimentos mal resolvidos, (o que é comprovado na experiência terapêutica) porém a psique não se transforma nem melhora por meio de uma intervenção corporal. Resumindo: na teoria psicanalítica a mente determina o corpo, é só através da modificação mental que se alcança a transformação somática.
Citei a sexualidade de passagem. Em termos claros: a terapia psicanalítica faz o obsessivo ficar menos obsessivo ao lidar com idéias acerca de sua sexualidade, porém nada se diz a respeito de uma melhora através da vivência da sexualidade. Pensar sim, viver não. Conseguem enxergar água benta e uma cruz marcadas na constituição do totem freudiano?
A prova maior de que não estamos acostumados com o corpo e a sexualidade é a mídia e os programas que exploram de forma sensual o corpo na televisão. É óbvio que quando vemos o belo nos mobilizamos, mas, se fossemos mais acostumados com a vivencia corporal e sexual não ficaríamos uma ou várias horas hipnotizados na TV, de repente uns dez minutos somente. Outro exemplo, extremamente contraditório, mas compreensível. Quer parar de ficar excitado ou excitada na praia? Peça para todos tirarem a roupa. A gente só fica curioso com o corpo porque o cobrimos e o adornamos, quando ele é exibido de uma forma simples e direta, as fantasias e elucubrações se esvaem. Pensem no médico... o corpo nu, quando encarado com simplicidade, se torna tão comum...
Para não deixar rastro de duvida. Não penso que ficar na academia 3 horas por dia seja pensar no corpo de uma maneira livre e saudável (se o sujeito for atleta ou viver do corpo é mais compreensível essa prática). Afirmo que é indispensável nutrir nossa vivência com cultura, relacionamentos, atividades mentais e sociais. Não obstante, creio que se torna vital (e revigorante) ter experienciais corporais e sensoriais na nossa trajetória. Até porque a minha mente faz parte do meu corpo, e meu corpo faz parte da minha mente. Parece simples, e de fato é.

terça-feira, 27 de abril de 2010

Morrer para ter trabalho ou trabalhar morrendo, eis o impasse!

Quando se fala de trabalho, levando em conta a conjuntura do nosso país, um número significativo da população evoca palavras que traduzem fidedignamente os sentimentos e percepções em relação a esse tema: correria, esforço, batalha, suor, etc. Não é nada fácil conseguir emprego no Brasil. A crescente competição e a falta de cargos disponíveis fazem com que os sujeitos travem um embate quase sangrento em busca de um simples cargo, que os faça sobreviverem financeiramente, uma subsistência, uma sub-existência. Os profissionais autônomos também penam, com o excesso de oferta de serviços e a escassez da procura. São muitos profissionais para poucos interessados. Esse é o primeiro estágio, então, conseguir trabalhar.

(Nem preciso citar o desespero de estar estagiário. Trabalhar mais que todos e receber menos que todos. Se recebem algo...)

Supõe-se que muitas pessoas param nesse ponto. Conseguir algo. Veja o número de desempregados à sua volta, é bem provável que muitos sofrimentos podem ser explicados pela influência desse fenômeno: depressão, drogas, violência, relações conflituosas, etc.
Vamos pensar além. As pessoas que estão trabalhando e são remuneradas. Elas trabalham naquilo que gostam? Sentem-se realizadas em suas rotinas? Prestam serviços aos outros com motivação e alegria? Observe e comprove. A maioria, não todos, trabalha como se apenas o corpo estivesse presente, a alma parece ter desaparecido há um bom tempo. Entram no local de trabalho esperando que o horário de expediente já acabe. Que a tortura acabe logo! Quem exerce seu ofício desse jeito pode pensar que a sucursal do inferno tem um tempo demarcado em suas agendas: 8 horas diárias e 44 horas semanais.A energia vai se esvaindo gradualmente. Em tarefas mal feitas, discussões com colegas- que também estão insatisfeitos- fugas do trabalho, desculpas esfarrapadas, atestados médicos, doenças, estress, crescente irritação e agressividade.
Quer dizer que quem tem trabalho está mal e quem está trabalhando pode estar até pior?
Morrer para ter trabalho ou trabalhar morrendo, eis a questão. Será que podemos superar esse impasse terrível?

Uma das soluções possíveis, na verdade, é extremamente contraditória. Ser escravo para tornar-se livre. Você quer fazer o que gosta, aquilo que pensa ter vocação e habilidade inata. Pois bem, é muito provável que você tenha dificuldades para exercer essa profissão com estabilidade financeira. Nesse mundo de competição, você terá que ser o melhor ou um dos melhores naquilo que faz. Para isso você terá que ser escravo do trabalho para depois se libertar dele, mais adiante. Terás que respirar cursos, estudos, qualificações, capacitações, provas, concursos, supervisões e consultorias. Há sofrimento nisso? Sem sombra de dúvida, há.
Mas lembre-se que é isso ou as duas primeiras opções anteriormente citadas. Também vale ressaltar que essa ação é pensada a longuíssimo prazo. Muitos desistem no caminho e acabam trabalhando apenas para se sustentar, e deu! Os corajosos que tentam esse terceiro caminho sofrem muito, por não verem o horizonte que se constrói logo adiante. Sofrem como todos, mas possuem um brilho que os diferencia da média: exercem seu trabalho com prazer, com paixão. Chegam em casa extenuados, mas com um senso de dever cumprido. Pode ser que isso não baste, mas parece ser mais atraente que chegar de uma atividade que não faz o menor sentido.
Há também outra alternativa, para não dizerem que não penso em outras possibilidades. O trabalho paralelo é muito adotado por aqui. Artista que é engenheiro, psicólogo que é administrador, escritor que é médico (conhecem alguém famoso nessa condição?). É uma saída, desde que não se deixe o verdadeiro ofício morrer, pelo acúmulo de tarefas oriundas da profissão ganha pão.
É claro que existem riscos nesses caminhos alternativos. A pessoa trabalha tanto naquilo que gosta que deixa de ter prazer com aquela atividade. Também há o perigo do conforto. O trabalho desprazeroso proporciona tanta estabilidade e prazer financeiro que o trabalho vocacional fica em segundo plano, amortecido. A pessoa possui tanta insegurança que não consegue se desfazer do conforto para lançar-se em uma atividade mais apaixonada e profunda. Não há um caminho exato a ser trilhado. De repente existam outros, ainda não descobertos. É, são tortuosidades dessa estrada, chamada trabalho.
















segunda-feira, 22 de março de 2010

Uma história inusitada...ocorrida na época da páscoa

Kátia e Ricardo eram colegas de aula. Estavam próximos e cada vez que se enxergavam todos notavam que havia um clima de paixão no ar. Até o Christopher notava isso, aliás, principalmente ele. O Ricardo achava que o Christhopher nutria algum interesse na Kátia, embora ele nunca tivesse presenciado um avanço real dele sobre ela. O olhar do Christopher para a Kátia e o Ricardo, conversando e rindo, era uma mistura de ciúme, paixão e curiosidade. Passava pela cabeça do Ricardo que, ao invés de vidrado, ele poderia ser viado mesmo. Nunca se deve rechaçar as possibilidades.
- Um baita gay recalcado, com certeza! – exclamava silenciosamente em alguns momentos.
Kátia era um caso a parte. Ela não dava tesão, ela era o próprio tesão. Seu olhar insinuava chama vulcânica, ostentava ambição de ser lasciva com o universo. Roupas, calças, pernas, batons, maquiagens e chiclete. O chiclete, saltitando nos dentes de Kátia, fazia com que muitos alunos passassem mal durante as provas. Ele ia, deslizava na carnuda de Kátia como um patinador no gelo, alegre e esbanjando elegância.
Ricardo era um homem calmo, porém macho e selvagem em essência. Por isso não era de se espantar que tivesse proposto para Kátia uma transa em um lugar isolado na faculdade, o famoso “ninho da luxúria superior”. Todos sabiam, alguns iam e maioria gostava de ficar rindo e sacaneando os casais que lá compareciam.
Naquele feriado nem o professor tinha ido à aula, apenas Kátia, Ricardo e alguns gatos pingados, que foram por razões diversas. O casal pré-copulante poderia até transar em casa, mas onde estaria a graça e a aventura?
Bateu nove horas da noite, os vigias cochilavam prazerosamente e lá estava o cenário ideal para Ricardo e Kátia adentrarem sorridentes no cafofo. Seria no feriado da páscoa que Kátia provaria a cenoura e os ovinhos de Ricardo, com apetite colegial, diga-se de passagem.
Foi a melhor transa que os bisbilhoteiros tinham presenciado. Urros, unhadas, mordidas e gemidos pervertidos. Como todos estavam no cio, a transa dos dois acabou gerando diversos gemidos orgásticos nos rapazes e nas meninas que observavam o evento.
Depois da transa, Kátia foi fumar um baseado, perto do laguinho, para fechar seu dia. Assim ela deixou Ricardo, solitário, pensando nos momentos de satisfação que havia proporcionado para a mulher mais desejada da sala de aula. Distraído e sentindo-se em outra dimensão, ouviu algo que quebrou sua concentração:
- Ela é boa demais, né?
- Christhopher! Quase me mata de susto, o que estás fazendo aqui?
-Só estava admirando vocês (olhar de psicopata). Você fez tudo direitinho.
Ricardo, meio assustado, não deu papo, botou seu casaco azul e resolveu dar no pé. Desejando boa páscoa para Christopher, saiu rapidamente do lugar, para evitar alguma cantada que Christopher ousasse cometer.
Saiu tão apressado que nem deu tchau para Kátia, entretanto teve tempo de formular o grande enigma que aquela noite tinha proporcionado para sua mente: Christopher era gay, tarado, bisbilhoteiro ou apaixonado por Kátia?
Ele não sabe até hoje responder essa pergunta, se tivesse perguntado para o segurança ele teria uma informação inusitada e misteriosa: Christopher era o irmão de Kátia.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Política!

Política é um tópico que me deixa inquieto e irritado demais (política, nessa crítica, no sentido de busca de poder passando por cima do outro... leiam até no final porque tento pensar em algum outro sentido para essa palavra ).
Isso porque as pessoas se dividem esquizofrênicamente em dois lados, inconciliáveis. Há exceções, sem dúvida. Os perdidos, confusos ou moderados, talvez se identifiquem comigo nas elucubrações. Não sei por qual começar, de tanta antipatia que desenvolvo por ambos os lados.
Vamos aos engajados politicamente então. Chatos e cegos. Faço esse relato pela observação de muitos grupos, sendo que algumas vezes fui convidado a participar deles. Existem muitos sentimentos negativos nessas associações políticas. Primeiro: a segregação do outro. Quem não veste a minha camisa e não carrega a minha bandeira é o mal personificado em carne e sigla. Quem não está comigo nessa luta que se dane, bando de alienados que não estão como cordeiros ao meu lado. Uma bela maneira de buscar a igualdade social, (se é que de fato seja isso o almejado) fazendo com que haja uma diferenciação extrema entre os grupos que estão posicionados na luta "democrática". Morte àquele que não é eu!
As reuniões são tensas, carregadas de mágoa e ressentimento. A descontração é como flor no asfalto, rara. A estratégias mais usadas não envolvem autocrítica e a promoção de idéias próprias. Ao contrário, são calcadas na desvalorização dos adversários e na expurgação alheia. Na minha opinião o pior defeito dos grupos denominados políticos é não abrir espaço para a alegria, o prazer e a espontaneidade. Eles ficariam surpresos ao descobrir que esses elementos são os mais poderosos na transformação da velha estrutura social. Outra coisa desconfortável é a exigência de que a dedicação à causa seja onipresente e inflexível. A nossa vida pode sim incluir a militância, mas restringir-se somente à ela é imaturidade ao meu ver.
Defender ideais e buscar a adesão das outras pessoas requer habilidade. A intenção pode ser ótima, no entanto a apresentação seca e desprovida de sensibilidade não (co) move nem mesmo a própria pessoa que postula esse ideal.
Outro aspecto é a criatividade nas propostas. É muito difícil ouvir ideias que sejam inovadoras e que incluam a maioria das pessoas na sua execução. Propostas que almejam participação popular são difíceis de serem pensadas, por isso são escassas. O planejamento e a execução de uma proposta política geralmente diz respeito a um grupo muito pequeno de pessoas.
Poucos comandam os caminhos da política. Uns por incapacidade de conclamar o interesse coletivo e outros por puro interesse e safadeza mesmo. Fica uma pergunta: Quem disse que as mudanças sociais só podem ser feitas com sisudez, rabugice e violência? Será que existe uma maneira menos azeda de provocar uma transformação no nosso cotidiano?

O segundo grupo é produto da ação do primeiro. São os desinteressados. Aqueles que pensam que política é um assunto chato, que não se julgam envolvidos no que acontece na sociedade. Os que acham que política é um grupo de ressentidos que tentam adquirir mais poder sucessivamente. Outros que acham que espiritualidade , política e bem estar pessoal são temas inconciliáveis. Seres que assistem o mundo desabar e não fazem nada a respeito. Seja pelo meio ambiente, seja pensando, seja escrevendo, seja gritando, seja sofrendo. Insensíveis a respeito do que acontece fora de suas casas.
Amo minha família, mas não busco melhorias apenas para eles, afinal o mundo não é habitado somente pelos meus ascendentes e descendentes. Mas, infelizmente, com a crescente avalanche do totalitarismo narcísico, (todos vivendo egoísticamente as regras do mercado de consumo) a política é apenas mais um instrumento para o lucro e o poder próprio. Pode-se se dizer que sempre foi assim. De repente os tempos atuais sejam simplesmente mais explícitos e escarrados, vai saber...
A questão é complexa, inicia no próprio conceito do que possa significar política. Para mim política é algo que eu faço em causa própria, que reverbera positivamente nos outros ou então algo bom feito diretamente para o outro e que, dialéticamente, acaba me influenciando benéficamente. Um pouco confuso, mas se parar para pensar é possível encontrar alguma fagulha nessa idéia.
Partindo disso, política envolve quase tudo que se faz na vida. Um esforço contínuo de ser uma pessoa melhor e tentar tornar o mundo melhor por tabela. Se acontece uma relação espontânea de pessoas em busca dessa melhoria, ótimo, porém se for um caminho solitário não tem problema. Até porque ninguém está sozinho nesse mundo, embora muitos se sintam assim.
Captei! No bater do gongo: política é perceber que não se está sozinho na rua, no ônibus, na fila do banco, no universo. Fácil, né? Complicado é agir.

sábado, 23 de janeiro de 2010

Outras direções ( relacionamento)

Acabar um relacionamento, seja ele de que natureza for, com um sorriso otimista só me foi possibilitado pelo advento da maturidade. É claro que um término não é motivo para fogos de artifício e cânticos de torcida apaixonados, porém também não é o passaporte para o inferno, como muitos interpretam.
As ligações não dão errado, apenas egostam suas possibilidades. É importante entender que tudo na vida tem um ciclo, nossa própria existência é prova cabal disso. Por que não seria assim nas relações? As pessoas que cruzam nosso caminho nos trazem mensagens, ensinamentos sobre o mundo e sobre nós mesmos. E a permanência da pessoa na nossa vida, de acordo com a minha opinião, só se mantém quando ainda temos algo a aprender e experiênciar através do contato.
Negar que certos relacionamentos estão com sua validade vencida é nocivo para nós e para quem se relaciona com a gente. Ficamos presos a algo que não possui mais a fluidez de antigamente e deixamos a outra pessoa estagnada, causando constantes desentendimentos e aborrecimentos mútuos. Para se admitir isso é preciso ter culhão, decretar o fim de algo nunca é agradável no momento, o alívio só chega tempos depois da coisa feita.
Penso que mais doloroso é dourar a pílula, ficar fingindo que é possível continuar quando na verdade estamos perdendo nossa energia vital a cada segundo que continuamos a conviver com quem não queremos mais. Não existem pessoas erradas, existem pessoas erradas para nós, seres que não se encaixam com nós naquele momento. E não saber isso traz conseqüências severas para nossa felicidade, isso porque deixamos de conhecer outras modalidades de encontro mais criativas e também porque privamos o outro dessa ter essa chance também. Parabéns! Você, com seu apego e medo de arriscar em busca de algo melhor, deixa duas vidas amortecidas e sedadas. Ambos na UTI, precisando apenas da força de vontade para saírem dessa situação. A sabedoria popular e a observação comprovam que preferimos ser infelizes com segurança do que inseguros tendo a perspectiva de obter alegria.

sábado, 16 de janeiro de 2010

Saber: prazer e saber simultâneo

Saber é prazer e sofrimento ao mesmo tempo. Como é bom descobrir potencialidades, adquirir consciência de que os sofrimentos são contornáveis e de que nada é tão determinante assim nessa vida. Por outro lado é um tormento saber que existem lacunas gritantes que nunca serão preenchidas, expectativas que nunca serão alcançadas, planos que só serão planos. Geralmente o saber implica também em querer passar esse saber adiante, dividir, tanto os conhecimentos bons quanto os maus. Os bons para melhorarmos o mundo, os ruins para amenizar a impotência diante dos fatos. Falo conhecimento mau me referindo a consciência de que existem aspectos negativos na nossa vida.
Muitos acabam enfraquecendo no caminho, pelo peso do conhecimento que adquirem, e buscam então não saberem mais, alienam-se, desligam o botão da consciência. Decidem viver a vida evitando descobertas, querem apenas o gosto do conhecido e do trivial. Ficam mais fixados no pólo maléfico do conhecer, afirmam que nossa consciência é um punhal que despedaça o coração vagarosamente. Como ser feliz sabendo da violência do mundo? Da pobreza do universo ? Da fragilidade do ser? Eu perguntaria: como ser feliz não sabendo de tudo isso?
Realmente não é fácil, vários sucumbem, não agüentam o fardo de saber. É por isso que pessoas diferenciadas são raras no planeta. Boa parte dos sujeitos descobrem algo e se tornam aterrotizados pelo conhecimento, escravo de seus pensamentos. Sua ação paraliza, por tudo aquilo que se acumulou. Escassos são aqueles que, ao tomar consciência, buscam agir, seja da forma que for, mas lutam corajosamente para mudar algo ou, quem sabe, para melhorar uma situação.
Há que se ter o cuidado para não ser um teórico da vida, pensar que o que já se sabe basta. Sempre terão novas situações para balançar nossos valores e crenças. Por isso quem tem medo do saber não está aplicando criativamente o que aprendeu.
Não se canse de saber, descobrir algo é uma dádiva. Embora seja doloroso em diversas situações, a ignorância é certamente mais letal, corroendo a mente e a alma dos corações desavisados. Quando se descobre algo e existe um desejo de superar aquilo que o conhecimento despertou de sofrido, a vida se torna maia rica e nos sentimos mais confiantes para adentrar no universo de corpo inteiro. Pobre daqueles que não querem aprender, e mais lamentável ainda os que sabem que podem descobrir muito mais porém hesitam por temor ou acomodação.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

A dança do acasalamento- parte final

Quando se está apaixonado e o seu alvo não percebe isso, a cabeça do apaixonado começa a girar em torno de como e quando esse sentimento deve ser anunciado. Com a escassez de tempo da época contemporânea, fica cada vez mais difícil encontrar uma brecha romântica para desovar os afetos guardados.
Imagine só, você chega de manhã, a pessoa lhe cumprimenta e você, sutilmente:
- Você é tudo pra mim! (tom apaixonado)
A amada, que nem acordou ainda, responde:
- O que foi? Tô com sono. Nem ouvi direito o que tu falaste.
- Falei que hoje ta bem abafado, calor do cão... (depois da resposta dela não deixa de ser verdade essa frase).
Ou então no almoço, enquanto comem aquele xis gordurento, você lá pelas tantas:
- Tu estás linda! Ela, ainda mastigando o monstro alimentar, diz:
- Tu sabe que hoje eu estou me achando uma baranga gorda?
Bééé! Tente outra vez!
Na aula ou no trabalho é melhor ainda. Ela está em apuros e pede cola, logo a ideia surge e você escreve no papel:
- A resposta é que estou vidrado em você. Ela devolve o papel, incisiva:
- Deixa de ser engraçadinho e me dá logo a resposta.
Vocês estão se despedindo de um dia duro e cansativo, a última chance é agora:
- Hum, ô guria , tá afim de sair qualquer dia desses?
Antes da resposta toca o telefone, ela atende com toda calma, é a amiga de longa data:
- E aí sua cadela! Que saudade de ti, blá, blá, blá...
Nesse momento o cara se sente tão ansioso, mas tão ansioso, que se sente como se estivesse esperando Deus dar o sinal positivo para sua entrada triunfante no céu.
Ele, com a cabeça virada e muito indignado, espera o diálogo vital para a o seu mundo, dando aquele riso estilo “quero te enganar, sua fazida, mas estou tendo que engolir tudo isso que estou pensando nesse momento”.
Ela desliga o telefone, fala que está atrasada e tem que ir. Ele se desespera:
Tá, mas e o convite? Aceita ir?
- De sair um dia desses? Claro. Com todo o prazer. Faz tempo que eu e meu namorado não saímos e ele está bem entediado, só em casa comendo e transando comigo, sabe como é né?
- Sei perfeitamente (coração partido e esfacelado), mulher que fica em casa acaba ficando meio balofa, não é verdade, amiga? (sorriso maroto)
- Aí amigo, eu te adoro, viu?
- Que nada, você que é tudo de bom.
Doce, doce...
Quando a coisa dá certo geralmente a pessoa que foi assediada desabafa:
- Era a coisa que eu mais queria na vida.
Se era a coisa que mais se queria na vida, por que passar tanto tempo sem nem ao menos tentar algo, só esperando algo acontecer?
Será que passamos boa parte da existência guardando herméticamente o que mais queremos na vida?


sábado, 2 de janeiro de 2010

A dança do acasalamento -parte 1

Ah, o jogo da sedução. Evento sempre fascinante. As regras são claríssimas, ao menos parecem ser. Antes de se aproximar você tem que expressar um amor superlativo e dedicação máxima para o seu alvo de investimento. Ela é a mais linda, inteligente e sensacional. Tudo exagerado desse jeito, para você descobrir mais adiante que foi apenas mais uma atitude exagerada sua e que você nunca aprende a ver as coisas como elas são. Na questão da aproximação, receber uma negativa corresponde à morte imediata. De repente a morte pode ser mais amena que uma rejeição, vai saber.
Os lábios começam a tremer, embrulhando as palavras, como um empacotador de supermercados inexperiente, geralmente aplicando a tática mais usual, nos casos de encontro em locais públicos:
- Hum, vamos dar uma volta? Se a menina em questão fosse uma pessoa que desejasse desestabilizar o nosso guerreiro diria:
- Para que dar uma volta? A gente vai chegar ao mesmo lugar em que estamos, e não há nada para se ver aqui. Mas geralmente essa fase é mais tranqüila. Ela só pergunta:
- Por que?
- Porra, não vê que eu quero te beijar sua tonta? Três horas prestando atenção, conversando elogiando, pagando coisas só pra você. É pedir demais? Na vida real ele apenas diz:
- É bom dar uma volta para pegar um pouco de ar puro.
Ar puro é patético, mas continua sendo uma das únicas alternativas socialmente viáveis nessas situações. No caminho da volta ele se ensaia:
- Então, sei lá, assim...essas palavras indicam algum pedido que a pessoa tem vergonha de fazer, mas mesmo assim insiste em tentar. Para complicar, a menina, que de boba não tem nada ainda provoca:
- O que houve? Tu está tão estranho? Como se não soubesse da fissura do coitado.
Então o cara pensa:
- Bom , que se fôda, eu tô aqui e é agora ou nunca. Ele respira fundo, toma fôlego, balbucia algumas palavras, que nem ele nem ela entenderão o sentido exato, e parte pra cima. Feito. Missão cumprida.
Depois de quatro horas, uma fome danada, vontade de ir ao banheiro, o beijo acontece. Pensamentos fervilham, agora é hora de puxar papo para encobrir o mal estar causado. Pensa, pensa em algo:
- Pô, tu viu aquele vídeo no you tube? É muito tri.
- Tu viu o perfil da Nandinha no Orkut? Que viagem!
Não pode ser algo muito profundo. Atenção! A profundidade geralmente afunda essas aproximações iniciais, por mais profunda que a pessoa seja. Vai entender...
A cena se repete com os casais que acabaram de se beijar: ele dá um sorriso largo de alívio e ela fica sem graça, com cor de vinho de tinto, porém com coragem e cara de pau para questionar o intrépido galã:
- Por que tu demoraste tanto pra me pedir um beijo? Pensei que nem estivesse afim ...
Nós merecemos mesmo.