sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

O veneno da ousadia no natal e no ano novo

Natal e ano novo: algumas considerações

1- Obrigação de festejar: esse imperativo de celebrar essas datas faz com que muitas pessoas fiquem reunidas no mesmo lugar de forma forçada e compulsória, tornando muitos encontros pessoais duros e sem sentido. Simplesmente pelo fato de que ninguém realmente planejou estar de corpo inteiro naquele momento. Além disso, quem não está com um humor eufórico e intensamente alegre é excluído sutilmente com comentários maliciosos: “quem trouxe essa pessoa aqui, o que essa pessoa tem, nossa, ele está tão mal”. O pior de tudo é quando se está passando por um momento difícil na vida e então é necessário colocar uma pedra por cima de tudo, atropelar seus sentimentos porque “é tempo de comemorar”...
2- Presentes – a sociedade conseguiu incutir na cabeça do ser humano a ideia de que os presentes são mais importantes que o afeto que os motivam. Pobre da criança que tem o carinho dos pais e não recebeu presentes, não é mesmo?
3- Aceleração frenética esquizofrênica- Nessa época todos correm para tudo. Como os dias entre o natal e o ano novo não existem, a maioria faz malabarismos para estar em dia com as suas obrigações. Fila pra presentes, contas, almoço, supermercado, calor, aglomeração, tontura e desespero. Todos irritados, sem paciência e prontos para viverem o natal...em suas casas. Patrolando os estranhos e pregando o amor e a solidariedade do nascimento de Cristo.
4- Concentração- Se você está estudando ou trabalhando em algo importante, desista! Existem coisas mais importantes para serem feitas. Qualquer coisa é mais importante que você mesmo, você ainda não aprendeu isso? Ainda?
5- Cobranças- Não existe um repertório muito criativo de assuntos abordados no meio familiar nessas celebrações. Vemos a predominância de temas extremamente irritantes, sempre em tom questionador: “e aí, vai se casar? Tá com emprego? Tá trabalhando em que mesmo? Vai comprar um carro? Vai viajar pra onde nas férias? E os filhos, quando virão”? Ou então cada um fica mostrando o quão é importante e merecedor de aplausos e elogios, num esforço comovente pra que todos o aplaudam de pé e coloquem rosas no chão que irá pisar.
6- Os sentimentos bons- somos tão cordeiros que tem gente que experiencia certas emoções apenas no natal e no ano novo. Fraternidade, abertura, sinceridade, carinho e afeição são fenômenos dessas épocas. Os otimistas pensam: “ao menos uma vez por ano eles sentem isso”. Os mais otimistas radicalizam: que tal sentir sem ser coagido”?
7- Comida- Finalizando com uma questão intrigante: se a comida desse período é tão boa, por que só se come uma vez por ano?

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Inconciliável

Às vezes parece ser melhor que ocorra num instante só. Fulminante, instantâneo e traumático. Em outros momentos parece ser até prazerosa a ânsia que vai crescendo dia após dia. Uma força estranha que vai corroendo, turvando e deteriorando os corações. Uma energia incolor e invisível que danifica a esperança e que o peso cotidiano concretiza de maneira indelével. A visão do repúdio desvelado pelos olhares alheios por onde se passa. Do regozijo daqueles que buscam o fracasso, o erro e a anti-vida. Da culpa ao avistar a pobreza, a deficiência, a pobreza e a real possibilidade de não se fazer nada sobre.
Nada sobra. Nem a tristeza fica. Tolos aqueles que se apegam à melancolia e às reminiscências. Não adianta relembrar. O organismo grita de fome e a comida sempre tem o mesmo gosto, apenas os disfarces sofrem mutação. O vazio é constante e implacável. A aridez humana chega no seu ápice. Não há terreno fértil que resista. O choro muitas vezes irriga e ajuda a florescer as flores minguadas no jardim da ilusão. Não podemos mais nos olhar. Os buracos das feridas nos cegam apenas no primeiro look. A areia movediça corre na imobilidade dos nossos movimentos. Não há saída. Nem chance de entrar novamente. Quem sabe começamos tudo de novo? A alma pesa e a mente quer leveza, pólos inconciliáveis. O diálogo é impossível, as opiniões já estão deformadas há muito tempo, o tempo de mudar nunca está no presente. No passado tudo parece ser passível de alteração e o futuro é uma infinita gama de impossibilidades. Basta começar a vivê-las e comprovar. Acordamos, brincamos de viver e quando nos cansamos adormecemos. O ciclo é interminável, ou melhor, termina para aqueles que acreditam nisso. Há poucos que pensam que isso nem começou. A inquietude pode até ser paz, o estrangulamento do ar nos satisfaz, porque nos julgamos honrados e dignos por sofrer. O prazer sempre tem dias contados, o sentimento blue não é imortal como os depressivos crêem. Queremos ser imortais indo ao mercado e comendo o pão light de cada dia. Não adiantam as drogas e as descargas de adrenalina. Isso só coloca mais espinhos em nosso andar. A única redenção é imaginária, isso não quer dizer que seja impossível. Até porque nossa realidade é tão instável que tudo isso mais adiante irá se tornar totalmente fora de moda.

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Habituados a odiar II

O ódio (pseudo amor) é mais aceitável em nossa sociedade. Exemplos não faltam. Estamos em uma sala de aula e dois coleguinhas se beijam (imagine crianças do mesmo sexo para ficar ainda mais radical). Se estivessem brigando a professora iria afastar eles e daria um castigo simples. Mas como estão se beijando e sendo carinhosos um com o outro viram um caso seriíssimo, até o psicólogo é chamado para intervir.
Outro exemplo. Um jogo de futebol. Em meio a xingamentos rotineiros um torcedor fala bem alto para o outro: eu te amo! O jogo é capaz de parar e até os jogadores correm o perigo de olhar para essa demonstração amorosa. Na família não é diferente, as implicâncias e as hostilidades são muito mais comuns entre os parentes. Vai demonstrar um carinho com mais intensidade para você ver o desconforto que vai causar. Tanto para você como para o ente querido.
Você é daqueles que é contra essa coisa de beijar em público? Pra que se beijar, né? Faz escondido como eu faço, não quero ninguém feliz e amando perto de mim. Namorados apaixonados são quase criminosos nessa sociedade. E são realmente. Alheios a tudo e a todos, verdadeiros idiotas. Para que essa alegria?
Por que o carinho e o afeto positivo nos deixam desconcertados e envergonhados?
Somos educados a restringir o afeto amoroso. Rapidamente vamos criando normas para sermos carinhosos com alguém. E infelizmente isso nasce no ventre da nossa família, que nos ensina, com exeções, a regular e controlar afetos.
Preciso saber quem essa pessoa é, se ela é legal, se merece meu carinho, etc. Criamos regras pra amar e não pra odiar. O ódio é legalizado, o amor é proibido.
O abraço e o beijo são como diamantes preciosos, poucos podem obtê-lo. Logo se vislumbra porque muitos são miseráveis no amor. Exatamente porque são miseráveis na maneira de se doarem para o outro. Você não ama, você praticamente sela um contrato. Ao invés de um aperto de mão, como nos negócios, você dá o beijo inicial. Pronto. Agora estou permitido a “me abrir” contigo.
Quando o “amor” acaba, imagine então o desespero, ter que começar tudo de novo. Ir atrás de uma nova pessoa, fazer um enorme esforço. Esforço. Essa é a sua palavra. Amar acaba sendo um esforço. Não deveria ser...
Isso sem falar nas negociações que existem no relacionamento. Não pode sair, não pode beber, não pode ficar mais tempo com os amigos, não pode sair sem mim, não pode e não pode! Penso que o presídio de repente gere regras menos rígidas que certas relações. Com essas leis você fala que ama. Claro que ama, mas como um objeto. Imóvel, sem vida, sem liberdade, sem...amor.

domingo, 18 de outubro de 2009

Habituados a odiar- (parte 1)

Odiar alguém é tão normal nos dias de hoje... Alguns irão dizer que amar também é tão natural como abrir os olhos depois de dormir. Mas desconfio que não estamos falando do mesmo amor. Não vou me referir aqui a esse tipo de amor, que se tornou tão vulgar que nem deveria ser chamado dessa forma.
Começamos por esse amor que não deveria ser nomeado como tal. Estamos no tempo onde existem inúmeros sites e espaços virtuais-midiáticos dedicados a homenagear alguém, “como fulano é bonito, como alguém é inteligente, como aquele cara sabe algo”.
Todos amam seus ídolos. Porém basta esse ídolo ter uma atitude que você não identifica como ideal que você passa a odiar ele (a). Claro! Você pensou que ele (a) era perfeito, mas, infelizmente, ele é como você. Que ódio! Mais um ser humano como eu! Que ódio, pensava que ele era superior a mim, porém é igual ou, talvez, mais inferior. Como não odiar?
Você se frustrou porque pensava que ele poderia lhe salvar de algo inevitável. Solidão, falta de sentido, pessimismo, egoísmo, coisas assim. Essa pessoa poderia lhe fazer feliz como ninguém fez. E assim continuamos a amar os outros, dessa linda maneira. Exigindo e colocando-os na mais alta responsabilidade de ser algo que não são. Você é realmente como se imagina? Se você é certamente não faz os outros carregarem um fardo tão pesado como o de “ter que me fazer feliz”.
Isso quer dizer que amamos os outros como se fosse uma troca. Eu dou (achando que é um grande acontecimento essa doação) e quero algo em troca. Amor não é isso. Isso é amoródio, um pseudo amor. Muitos especialistas falam em ambivalência, amor que vira ódio e ódio que vira amor. O fato é que isso só existe quando somos crianças. A criança ama e odeia com uma rapidez incrível, isso porque está aprendendo a se conhecer, não tem noção exata de que é alguém independente e livre, analisando os outros da mesma forma. Todos são extensão de si, logo quem não me satisfaz não merece perdão. Odeio, então.
Quando vamos crescendo, nos damos conta de que não se pode controlar ninguém. Nem nós mesmos, muitas vezes. O grande problema é que poucos admitem que são falíveis, passíveis de fracassos e misérias. Que não sabemos um décimo de quem somos e de como será nossa caminhada. Que não sabemos aonde tudo isso vai dar no final. Somos os críticos e o executores do mundo. Todos merecem ser punidos.
O amor vem com a maturidade. Aceito o outro porque me aceito, me perdôo. Sou humano, perdi, sonhei, caí. Tenho lados podres e não brilhantes.
A sociedade estimula a infantilidade, até porque não existe consumidor mais perfeito que a criança. Tudo lhe falta. "Preciso de tudo porque não consigo enxergar o que já tenho, não tenho tempo para desfrutar do que possuo, preciso de algo novo imediatamente". O ódio e o pseudo amor reinam porque não somos educados para nos enxergar de verdade, o outro é que me revela. Assistir televisão, navegar na internet, ler jornais e livros, você já se leu por acaso? Claro que não. Que idéia ridícula, não? Pra que eu vou centrar atenção numa pessoa tão insignificante como eu? Não há nada de surpreendente em mim. Será mesmo? Não digo que é preciso abandonar tudo que é externo. Mas preste um pouco mais de atenção em você.
Você vai se deslumbrar ao se ver como realmente é. E só assim poderá amar realmente o outro, porque não exige mais nada de ninguém, nem de si mesmo. Estará um pouco mais livre do ódio e mais próximo do amor.

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Será que nos divertimos mesmo?

A maturidade chega e com ela vamos começando a nos tornar rotineiros e condicionados. Muitos culpam o trabalho. Até porque poucos nesse país conseguem fazer o que realmente almejam como missão ou dom. Tudo certo. Mas pense em como você usa o seu tempo livre. Será que é livre e criativo? Não sei.
Só sei que a maioria das pessoas que eu conheço se diverte da mesma maneira todo fim de semana. Não critico o que fazem, e sim como fazem.
Costumam ir ao mesmo lugar, falar as mesmas coisas, beber as mesmas bebidas, comer as mesmas comidas, ver as mesmas pessoas. Pelo jeito não percebem que sua festa é tão mecanizada como o seu trabalho. Pior que isso, seu trabalho é capaz de ser mais criativo que seu tempo livre.
Isso requer reflexão. O sistema, de uma forma bem sutil, controla também o seu jeito de aproveitar o tempo livre. Você tem horários marcados para se divertir, horas contadas e formatos pré-concebidos para extravasar seu demônios, aprisionados no trabalho. Seu corpo já sabe decor como reagir. No sábado você come e bebe mais do que qualquer outro dia. O organismo já se ajeita no anoitecer saturnino para poder dar conta do que você vai exceder.
O que isso gera? Você se acostuma com tudo. Sua existência consiste em permanecer o mesmo o tempo inteiro. No trabalho você anseia que chegue o fim de semana. Para que?
Para relaxar? Você sabe bem que não relaxa. É capaz de se incomodar mais do que no dia-a-dia. A rotina do descanso muitas vezes é mais pesada que a do trabalho.
Como quebrar isso? A saída pode estar em tentar fazer o inusitado, quando isso for capaz. À medida que despertamos desse sono da repetição, começamos a tornar nossa rotina mais criativa, mais desafiadora. O próprio trabalho ganha a oportunidade de se tornar mais prazeroso, assim como nosso descanso também estará equilibrado e inovador. E não da forma como a sociedade espera. Não é possível que o ser humano, sendo tão diverso e rico, só queira ter prazer e aliviar as tensões de uma só maneira.

domingo, 4 de outubro de 2009

Vício

Vício. Impossível pensar nesse tema sem se incluir na história. Geralmente esse termo carrega uma noção pejorativa, indicando uma dependência que temos em relação a algum comportamento ou coisa. E o valor ou demérito desse vício é mensurado pela sociedade. Outro fator que torna a questão do vício complexa é o hábito. Até que ponto estamos habituados ou viciados em algo. E será isso tem alguma diferença?
O viciado é visto sempre como um errante, alguém que não se controla e cede à tentação de algo, que costuma gerar prazer. Só que nesse julgamento está um valor imposto pelas normas sociais. Alguém viciado em ajudar os outros ou trabalhar nunca será taxado de viciado, porque isso traz benefícios para a sociedade. Não se discute o quanto a pessoa é dependente desses atos, e sim se aquele vício é bom ou não. Um funcionário que é pego com drogas é expulso do trabalho e aquele que esquece de si mesmo e das suas relações pessoais vira o funcionário do mês. O lucro, o cifrão ($), que dita se um vício é aceitável ou nos traz repulsa.
O vício traz consigo uma vontade de não se sentir, evitar contato com algo que cutuca, incomoda, o chamado vazio existencial. Aderimos ao vício para esquecer, mas esquecer o quê? O mundo atual não é muito doce para ser lembrado com grande consciência. Sobre esse prisma, o caos que estamos vivendo é, com certeza, um convite para o esquecimento e para o vício.
Não é à toa que observamos todos se repetindo, poucos ousando, pois o vício é seguro. Em certo ponto não importa mais o prazer que o vício dá e sim a segurança que ele nos prorporciona. Estar imerso em um vício é dizer para si que o mundo será sempre igual, que no final tudo estará bem. E sinceramente, não venha me dizer que ninguém precisa um consolo como este, vivendo em um mundo tão desesperador como o nosso.
O vício, no começo, por mais contraditório que possa parecer, pode ser criativo. Iniciar em um vício pode significar uma necessidade de entrar em um mundo de sensações diferentes do cotidiano. Provocar um choque diante mesmice que se vive. Se enxergar de uma nova forma. Um vício diz com acuidade como queremos ser vistos e as feridas que carregamos em nós.
O equívoco está em tentar repetir aquela sensação nova travestida com algo que com o passar do tempo também se tornará habitual. Outro chamado que o vício faz é de transcender, superar nosso corpo, superar nossos medos e vislumbrar algo que nos oriente e nos dê sentido. Mesmo que isso não seja feita de uma maneira saudável, ainda assim é um chamado.
Eis questão central: qual é o chamado que um vício nos faz? O que ele diz de nós? Qual sua mensagem? Isso é fundamental para superá-lo, se assim quisermos. Além disso, é necessário vivenciar a experiência de uma forma intensa e atenta. Quanto mais fundo mergulharmos na vivência de um vício, mais rápido descobrimos porque estamos tão atrelados a ele e, num piscar de olhos, ele já não é necessário, porque já vimos tudo o que havia para ser visto nele. E pulamos para outro... e continuamos nossas vidas por aqui, nessa jornada tão estranha e viciante.

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Renovação no olhar do viajante

Viajar sempre é uma experiência rica. Conhecer novos lugares ativa pontos, até então, desconhecidos da gente. Sair de nossos “portos alegres e seguros” proporciona relatividade sobre nós mesmos. Temos a tendência de achar que nossos valores são absolutos. Viajar nos dá chance de quebrar a rigidez que carregamos muitas vezes no nosso jeito de viver.
E isso se aplica na vida cotidiana. Quanto mais pessoas conhecemos, mais gostamos daquelas que realmente nos fazem bem. E não ao contrário. Pessoas que não se abrem ao novo correm mais riscos de abandonar o velho, justamente porque com o novo até o velho se renova e ganha mais brilho.
A traição é assim, quanto mais se está acostumado e estagnado, mais se está propenso a enamorar-se por situações que provoquem contraste da situação experienciada na rotina. Não se está apaixonado pela pessoa nova em si, e sim pela sensação de renovação que a aquela pessoa traz e incita na gente.
É por isso que eu voltei ainda mais apaixonado pela cidade e pelas pessoas que conquistei aqui. Às vezes temos que dar a volta ao mundo para sabermos que nosso lugar de fato era o ponto de partida.

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

O Homem escondido

Todos desejam a mulher no mundo contemporâneo. Receptiva, compreensiva, macia, suave, intuitiva, piedosa, linda, poderosa, glamurosa... Quem seria louco de não querer também, né? O que sobre para o homem de hoje? Agressivo, manipulador, inconsciente, intolerante, infantil, desordeiro...
É assim que nos vemos atualmente. A mulher de hoje é arrojada, sabe tudo, tem iniciativa, trabalha, cozinha e cuida dos filhos, como as revistas não cansam de panfletear.
Ser homem hoje é um quase um desaforo. Não é à toa que estamos (nós, homens) nos tornando mulheres, além de continuarmos desejando as mulheres. As carcterísticas ditas masculinas são tachadas como inferiores e como compensação acabamos vivendo-as de forma inferior também.
Não se trata de depreciar a mulher, e sim de colocar o homem no mesmo patamar de julgamento. É claro que não se pode ignorar a opressão que a mulher sofreu durante toda a história, mas isso não é justificativa para se vingar ou causar a mesma opressão que foi impingida.
Uma das frases que mais me fascina é essa: “as mulheres estão masculinizadas”. A pessoa, que diz essa frase, quer passar a noção de que a mulher está sendo tão miserável e escrota como o homem. Está traindo como um homem, fazendo sexo como um homem. Mas peraí, então a mulher não sente isso autenticamente, ela copia simplesmente o que o homem faz? Ela escraviza e domina porque se identifica com o homem? Isso que é realmente interessante, o que a mulher faz de admirável é feminino, e o que faz de deplorável é masculino.
A mulher hoje é divina e especial, o homem faz guerras e destrói o mundo. É o mesmo que dizer que o homem é fofoqueiro porque está imitando as mulheres. O homem é fofoqueiro da mesma forma que a mulher pode ser capaz de fazer guerras. Na verdade o homem está cada vez mais agressivo porque está castrado, não consegue mais expressar seus instintos e sua animalidade de uma forma natural. É um homem escondido, asfixiado, que quando liberto provoca uma catarse incontrolável e muitas vezes nociva.
Homem e mulher possuem defeitos e virtudes aleatórios, não é demérito ter nascido homem e nem uma benção ter vindo mulher ao mundo. Cada um é divino e diabólico à sua maneira.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Encarando

Pegue um elevador com uma pessoa desconhecida e se observe. Conclui-se que é uma das situações mais constrangedoras que passamos na vida cotidiana. Por que? Primeiro porque no elevador temos que olhar, não temos escapatória. E ao olhar o outro algo é despertado, querendo ou não. Repulsa, desejo, simpatia, etc. Vivemos em mundo onde o contato físico é menos constante que antigamente, portanto não estamos tão acostumados a sentir o outro. Nosso olhar chega a ficar vesgo de tanto observar, mas entrar em contato nem pensar...
Isso quer dizer que olhamos, mas sem a atenção de fixar objetivamente o olhar sobre algo, o que é bem diferente. Note quando você olha atentamente alguém, por mais tempo... logo logo você será julgado como mal educado ou invasivo. "Não quero que fiquem olhando para mim"...
Você se olha no espelho por muito tempo, mas não admite ser olhado pelo outro, o que isso quer dizer? Que somos extremamente vulneráveis e inseguros sobre quem somos. O olhar do outro me desnuda, e o meu próprio olhar (no espelho) me deixa estático, só confirma aquilo que imagino ser. Só nos sentimos julgados porque julgamos a torto e a direito. Por isso não temos paz. Se eu sair com um cabelo verde na rua vão rir de mim. Não é verdade absoluta, pode até ser, quem sabe, mas quem vai rir realmente de alguém com cabelo verde sou eu mesmo. Aquele que mais evita ser piada é aquele que mais ri daquele que é alvo da piada. Abertamente ou de uma forma dissimulada.
A virtualidade das relações acentuou ainda mais essa incapacidade de empatia e percepção alheia, ficamos amedrontados quando somos colocados em situações de interação próxima com estranhos. Estamos tão fragilizados que o contato se tornou ameaçador, o outro se tornou o inferno. Mas o que esquecemos que o outro é apenas uma invenção, os outros somos nós, quem eu evito olhar é uma parte minha que ainda está adormecida. Que tal acordar e realmente, olhar?

domingo, 6 de setembro de 2009

Solidão ou multidão em nós

Solidão. Sensação que faz o mundo se mover de infinitas formas. Uns tentando fugir, uns sofrendo para aceitar e raros desfrutando e compreendendo o prazer de se descobrirem, sós.
Podemos estar rodeados de pessoas e, mesmo assim, nos sentirmos solitários, ausentes, e distantes. Por mais contraditório que pareça, o ser humano é capaz de ter uma multidão em si mesmo e mesmo assim se sentir solitário.
Todos nós temos vozes internas (isso não é esquizofrenia, ou será?), basta identificá-las. Que fome! Que dia chato! Não devia ter feito isso! Como eu gosto de fulano! Quem diz isso? Será que é você mesmo?
Somos habitados pelos sons da nossa família, não podemos estancar seus ruídos, que reverberam em nosso ser. Abrigamos infinitas vozes: dos nossos amigos, comerciais de televisão, das músicas que ouvimos, dos professores e mestres, de inimigos, etc, enfim, sua memória é a prova de que você está repleto de sons, mas não apenas sons, mas olhares, expressões, movimentos, cenas, roteiros, cenários.
Voltando a solidão. “Me sinto só”. Geralmente essa frase, quando dita em tom choroso, não expressa o que realmente se quer dizer. Soaria mais aceitável algo como “preciso de alguém, quero uma companhia, preciso compartilhar, necessito de carinho”. Isso porque você nunca esteve só, nasceu cercado de pessoas. Sua mãe bateu papo e lhe deu um lar durante nove meses, lhe deu comida, cantou até, quem sabe. A questão é que reclamamos da solidão porque não olhamos para nós mesmos, não percebemos que somos como um, entretanto, uma multidão. Descobrir isso é assutador. Isso porque quando nos olhamos a fundo achamos ecos que não nos agradam, palavras e coisas que nos deixam desconfortáveis.
Fugir da solidão. Não seria melhor então dizer “fugir da multidão”? “Por favor, não me deixe aqui com essa multidão, essas vozes contraditórias vão me deixar atordoado”. “Delete esses meus arquivos internos, parece que estou repleto de vírus e cavalos de tróia, vou ter uma pane, pifarei”.
É o que tememos, estar a mercê de nossos pensamentos. O dito popular “a mente vazia é a oficina do diabo” não é por acaso. Não pensar em nada é estar repleto de pensamentos, de todos os tipos e intenções (na verdade não é bem assim, em outro texto eu me explico).
A terapia é simplesmente um exercício de audição, pois naquele lugar vou ouvir as vozes que eu estava abafando durante muito tempo.Gritos, revoltas, mágoas, exaltações, planos, tudo registrado e latente por vários anos. É compreensível que as pessoas que se descobrem múltiplas precisam de um tempo a sós, fisicamente falando. É como uma reunião de condomínio, na qual o síndico descobre vários moradores novos. É preciso tempo para conhecê-los, cobrar o aluguel de alguns, questionar outros, se enamorar e admirar inúmeros.
Por isso não nos entendemos, você quer entrar em concordância com algo externo estando completamente dividido por dentro? Impossível. Quanto mais você se ouve mais aceita os outros, simplesmente porque você já ouviu algo parecido dentro de você. A gente deixa de ser julgador, porque se dá conta que temos todos os personagens de todos os enredos do mundo. E lhes digo, quanto mais você não tomar conhecimento de algum morador, mais chances ele tem de comandar o condomínio inteiro sem que você saiba.

Um poema curto e ilustrativo do texto:

Não me sinto só
Um dia fui só
Hoje só sou porque sou apenas
Só.

( Giordano)

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

O veneno da Ousadia ( abrindo a casa)


Na dança da vida podemos ficar assistindo os outros dançarem e se divertirem durante a vida inteira. Ou, quem sabe, arriscar os nossos próprios passos (por mais estranhos e inusitados que possam parecer) e bancar certo preço por essa ousadia.
A ousadia é venenosa e contagiante...
Aqui será um espaço para reflexões, discussões, encucações, desabafos, críticas, confissões e declarações. Sempre reivindicando espontaneidade, liberdade, fraternidade e prazer.Tudo pinta por aqui. Música, poesia, psicologia, política, ocultismo, manifestações culturais, opiniões, espiritualidade... O que vier veio bem...
Sobre idéias e pontos de vista: As idéias duram o quanto for necessário.
Bem vindos!
Previsão de postagens semanais.

Julgamento

Existem muitas atitudes que colaboram para um universo mais amargo e sombrio. Uma delas, sem dúvida, é o ato de julgar. Atribuir valor a algo ou comparar alguma coisa em relação a nossos próprios (pré) conceitos.
Saia na rua, observe-se e observe ao redor. O olhar quase sempre é de análise, uma postura de reserva e distância. Quem é essa pessoa, que roupas são essas? Precisamos, me incluo nisso, ter um aval certeiro sobre a pessoa que estamos nos relacionando. Para entrar no nosso mundo afetivo é imperativo passar por uma bateria de exigências que fazemos. Sendo que quase sempre não preenchemos esses critérios, de repente por isso exigimos que os outros preencham...
Não digo que devemos olhar o mundo como uma pluma inofensiva pairando em um céu azulado. Mas devemos tentar olhar o outro com mais compaixão, não pelo outro, inicialmente, mas por nós mesmos.
O julgamento é muito mais prejudicial a nós mesmos do que qualquer outra pessoa. Nos tornamos escravos dos próprios conceitos, que acabam impedindo uma experiência mais livre e plena. “Não posso fazer isso”, “não sei fazer isso”, “não faz o meu tipo”.
O julgamento é uma submissão ao passado, é o nosso passado modelando presente e futuro. É nosso hábito de dizer não ao novo, de continuar estagnado a algo que, supostamente, conhecemos.
Libertar-se do julgamento nos torna mais sinceros e felizes, mais aptos para encarar a realidade da forma como se apresenta, evitando uma vivência esquizofrênica e irreal, guiada perante experiências anteriores. Se meu passado é vermelho nunca vou ver o presente branco, e sim rosa. Não verei nunca o branco, minha cor passada sempre irá atrapalhar minha percepção presente.
Provarmos outros enredos e outras histórias não nos faz perdemos nosso centro. Tudo que foi vivido sempre viverá em nós, é inevitável. Mas por que não nos lançarmos em algo que pode ser criativo e excitante para nossas vidas?
Você nunca vai atingir o que as pessoas esperam de você, você vai atingir o que suspostamente acha que as pessoas esperam de você, o que é muito diferente, portanto achar e seguir suas expectativas é a atitude mais pura e certa a ser feita. Você tem, antes de tudo, um compromisso com si mesmo. Não fuja e nem deixe que os outros lhe façam fugir. Nem preciso dizer que isso tem um preço, que poucos tem coragem de bancar para saborear.