terça-feira, 15 de novembro de 2011

O homem escondido

Todos desejam a mulher no mundo contemporâneo. Receptiva, compreensiva, macia, suave, intuitiva, piedosa, linda, poderosa, glamurosa... Quem seria louco de não querer também, né? O que sobre para o homem de hoje? Agressivo, manipulador, inconsciente, intolerante, infantil e desordeiro.

É assim que nos vemos atualmente. A mulher de hoje é arrojada, sabe tudo, tem iniciativa, trabalha, cozinha e cuida dos filhos, como as revistas não cansam de panfletear.

Ser homem atualmente é um quase um desaforo. Não é à toa que estamos (nós, homens) nos tornando femininos, além de continuarmos desejando as mulheres. As características ditas masculinas são tachadas como inferiores e como compensação acabamos vivendo-as de forma inferior também.

Não se trata de depreciar a mulher, e sim de colocar o homem no mesmo patamar de julgamento. É claro que não se pode ignorar a opressão que a mulher sofreu durante toda a história, mas isso não é justificativa para se vingar ou causar a mesma opressão que foi impingida.

Uma das frases que mais me fascina é essa: “as mulheres estão masculinizadas”. A pessoa, que diz essa frase, quer passar a noção de que a mulher está sendo tão miserável e escrota como o homem. Está traindo como um homem, fazendo sexo como um homem. Mas peraí, então a mulher não sente isso autenticamente, ela copia simplesmente o que o homem faz? Ela escraviza e domina porque se identifica com o homem? Isso que é realmente interessante, o que a mulher faz de admirável é feminino, e o que faz de deplorável é masculino.

A mulher hoje é divina e especial, o homem faz guerras e destrói o mundo. É o mesmo que dizer que o homem é fofoqueiro porque está imitando as mulheres. O homem é fofoqueiro da mesma forma que a mulher pode ser capaz de fazer guerras. Na verdade o homem está cada vez mais agressivo porque está castrado, não consegue mais expressar seus instintos e sua animalidade de uma forma natural. É um homem escondido, asfixiado, que quando liberto provoca uma catarse incontrolável e muitas vezes nociva.

Homem e mulher possuem defeitos e virtudes aleatórios, não é demérito ter nascido homem e nem uma benção ter vindo mulher ao mundo. Cada um é divino e diabólico à sua maneira.

sábado, 15 de outubro de 2011

Sem turma

Esse pensamento vem à tona principalmente quando estou na mesa de um bar, ou em algum lugar noturno. Isso porque, quando estou com um grupo de pessoas, acabo muitas vezes discordando da opinião que está sendo formada e dos valores que são propagados naquele espaço. Geralmente existe um desrespeito à diferença e uma busca incessante de identidade, de normatização. A pessoa que pensa diferente e possui gostos peculiares geralmente vira motivo de piada e desvalor. Por exemplo, não beber. Não beber álcool em algum agrupamento adulto-jovem é praticamente uma agressão, brindar com um copo de suco pega muito mal. Afirmar a singularidade incomoda muito, porém ter que sustentá-la em alguns espaços é realmente muito sofrido. Procuro gente que não tenha turma, que não esteja muito encaixada em alguma coisa, prefiro os que são meio tortos, prioritariamente solitários e excêntricos. Só não faço uma galera desses porque eles odeiam turma. O que eu quero dizer é que sei estar nesses lugares, mas não gosto nenhum pouco do jeito que fico nessas situações. Muitas vezes tenho a vontade de sair da mesa e ir embora, porque acho alguns assuntos extremamente desinteressantes e monótonos.

É engraçado que algumas pessoas se tornam bacanas quando estão sozinhas. De repente sentem que não há necessidade de se usar uma mascara, que elas podem ser elas mesmas sem nenhuma restrição. Um papo de turma é um baile de máscaras, as opiniões poucas vezes refletem sensações autênticas. Triste é o ser que vive imerso nessa dinâmica, que não saí desses grupos para respirar e sentir o ar novo, de ouvir a voz dos seus reais pensamentos, tormentos e prazeres.

Busco sempre me relacionar, mas também não tolero situações em que tenho a certeza de que a interação que está acontecendo é meramente formal, ou virtual.

Não pense que eu me enquadro em um grupo de rebeldes. Nem pensar, um grupo de rebeldes já não é rebeldia, ao menos que esse grupo deixe todos à vontade para se expressarem, o que sabemos que não acontece mesmo.

O problema, corriqueiramente, é ser do meio termo. Ser louco para os moderados e moderado para os loucos. Ser engajado para os alienados e muito alienado para os engajados. Artístico para os científicos e científico demais para os artistas. Na verdade o meio termo é o meu termo, porque não preciso me balizar pelo outro, não preciso ter uma medida de como eu sou e muito menos ser avaliado por isso. Não acho que todos devam aderir à minha opinião, acho sim que as pessoas deveriam ter opiniões mais singulares, pontos de vista que realmente fossem únicos e refletissem o que realmente são e sentem. Um lugar com pessoas autênticas dificilmente será uma turma, mas pode ser uma interação de pessoas felizes, que estão ali sem ansiedade e necessidade de mostrar ou provar algo a alguém.

domingo, 9 de outubro de 2011

Profissão psicólogo

Um dos ofícios mais estranhos e controversos do universo laborativo é o do psicólogo(a) . O que ele faz? Como ele deve ser? Onde deve atuar?Realmente é um fazer de difícil definição. Essa flexibilidade potencial causa prazeres e também dificuldades aos que escolhem a profissão. Como vamos aprendendo na faculdade, tudo ( ou quase tudo) é passível de discussão e problematização.

Por exemplo: o quanto um psicólogo deve estar preparado para atender as pessoas. Muitos defendem que o psicólogo deve (tem como?) ser uma pessoa superior, neutra e preparada para resolver com tranqüilidade e facilidade os dilemas humanos. Teria que estar pronto e ter suporte emocional para suportar os conflitos existenciais. Quanto menos se afetar melhor, conseguirá mais facilmente olhar com parcimônia e equilíbrio a questão que o outro lhe traz. Um psicólogo vai sendo treinado para não dar opinião, mas trazer elementos que facilitem e enriqueçam a opinião da pessoa e/ ou o coletivo atendido. Mas será que é possível não ter opinião, não se deixar tocar? Essa é uma proposição complexa. Porque um profissional que não consegue silenciar-se provavelmente não terá espaço para acolher outros conteúdos. Mas silenciar, é importante frisar, ao meu ver, significa deixar em segundo plano, não simplesmente eliminar e excluir. Um profissional que trabalha com a mente precisa saber que tudo que for excluído não será de fato excluído, as coisas que sentimos não acabam, se transformam. A neutralidade, por exemplo. A opção por ser um espelho, um mero reflexo que ajuda ao outro se encontrar é mera ilusão. Isso porque é impossível não termos cor, não termos uma posição. A dificuldade que alguns ingênuos tem é de visualizar o que de fato estão fazendo. Quando apresento o nada para a pessoa, não estou deixando espaço para a relação acontecer. Estou manifestando conscientemente um vazio para a pessoa, uma falta, mas por outro lado estou me eximindo e ao mesmo tempo estou me posicionando. Afinal, não fazer nada é uma ação. Não falar nada é uma poderosa mensagem. O profissional pode buscar não ocupar grande espaço e isso pode ser benéfico, mas nunca deve se esquecer de que precisa estar presente, necessita ocupar um lugar. Quer dizer, não fazer nada deve ser uma opção e não uma proibição. Entender isso é muito importante, e penso que é uma reflexão que nunca irá se esvaziar no dia-a-dia da profissão.

Mas o grande fato que observo é a conseqüência dos enunciados pedagógicos na prática da psicologia. Somos ensinados a analisar e trabalhar com o outro. Isso, claro, é um sintoma social amplo. Nossa educação não privilegia o interno, precisamos descobrir o outro e algum outro nos descobrirá. Não quer dizer que devemos ser onipotentes e completos, que não precisamos do outro para nos construir. Porém é fundamental ter noção de que somos responsáveis e que algumas descobertas serão apenas percebidas por nós.

Em outras palavras: somos treinados para olhar para fora, e não olhar para dentro. Isso gera vários danos. A vida de muitos profissionais vai evoluindo, mas sua satisfação e prazer de viver vão diminuindo em medida inversamente proporcional. Quanto mais auxílio a evolução alheia, menos me dou conta do meu próprio desenvolvimento.

Portanto se você escolheu essa tarefa cuide-se, escute-se e lembre-se de que é preciso ser algo, afinal o nada sempre será algo.

domingo, 12 de junho de 2011

San Valentin

Por toda a minha vida sempre me perguntei: será que existem, de fato, histórias de amor? Naquele verão aconteceu algo que fez reacender a chama dessa inquietação. Estava eu a veranear em Mariluz, praia do litoral gaúcho, quando presenciei um encontro bem peculiar.


Quem eram estes seres? Como eram os seus caminhos? Ela era uma menina recatada, simpática e com olhar onírico. Estava no hotel acompanhado os pais. Aquele hotel não era novidade para ela. Sempre passou as férias por lá, em incontáveis verões. Sentia-se entediada ao ver os mesmos rostos e ao realizar as mesmas atividades. A garota, atrás do semblante pacato que aparentava, carregava em si muita curiosidade e sede de viver histórias inusitadas. Tinha uma alma aventureira, por trás da fachada cordial de seu sorriso. Situava-se em uma etapa lúdica e descompromissada, tinha se magoado ao investir seriamente em algumas pessoas do passado. Queria adentrar em uma nova fase.


Ele se encontrava em outra direção naquele momento. Foi ao hotel para descansar, tocar violão e pensar na vida. Adorava refletir-se na existência. Era um cara desconfiado, simpático, mas com um jeito esquisitão. Conhecia muitas pessoas e era muito bem humorado, porém poucos o conheciam em sua intimidade.


Os caminhos deles se cruzaram quando o recreacionista, em tom eufórico, pediu para que ele tocasse violão para as pessoas do hotel. Ele titubeou, porém aceitou. Pensava que não tinha nada a perder mesmo. Mal sabia ele o quanto estaria mudando seu destino dando aquele singelo sim.


No meio da apresentação o músico notou que uma pessoa em especial cantava praticamente todas as músicas que ele entoava. Ao final de cada canção, ele pensava intrigado e feliz ao mesmo tempo: quem será essa guria tão sorridente e com uma memória tão abundante? Ela, vendo ele cantar, questionava-se em alguns instantes: quem é esse cara, o que está fazendo aqui nesse hotel? Será que está sozinho? Ou veio com a família? Eu observava tudo e imaginava o desdobramento desse enredo, tendo a intuição de que aquele encontro iria gerar outros movimentos.


Após o descanso da noite e ao ascender do dia eles se encontraram na academia. O rapaz tentou uma aproximação, porém ela foi distante e pouco comunicativa. A sua atitude destoou daquele sentimento inicial, captado na noite anterior. Parecia que alguma coisa estava errada, as cousas simplesmente não faziam sentido para ele. A menina também se percebeu estranha, entretanto não soube evitar a forma com que o tratou naquele momento. Descobriram que estavam na mesma faculdade, ele era do prédio 11 e ela do 12. Trocaram algumas outras informações triviais e, como aquele encontro tinha sido efêmero, ambos seguiram suas atividades no hotel.


Depois do ocorrido ele tinha deixado de lado as expectativas, não estava se importando lá com muita coisa. A noite chegou e ele seguiu a tocar seu violão despretensiosamente. Resolveu pegar seus apetrechos e foi para um banco perto do campo de futebol. Lá estava calmo e com uma ambiência inspiradora para processos criativos. Nisso, a menina observou que ele estava tocando há um bom tempo e decidiu passar por lá para conversar e passar o tempo, que corria de forma tão monótona. Mas ao mesmo tempo ela se angustiou. Como uma pessoa tão tímida teria coragem de ir lá espontaneamente para bater papo? Hesitou muitas vezes antes de ir, contudo resolveu ir ao campo de futebol de coração aberto.


Quando a voz dela se anunciou ele tomou um susto. Não esperava que a moça, depois do episódio da academia, estaria querendo a companhia dele. Tinha a impressão de não ter agradado. Quando conseguiram avançar sobre a vergonha, começaram a se conhecer de verdade. Ela foi mostrando o seu senso de humor observador e sua doçura através da voz e dos gestos. O rapaz foi mostrando o quão sensível era frente ao universo e aos afetos, apesar da máscara despreocupada e onipotente que ostentava muitas vezes. A escuridão da noite trouxe luz e foco para aquilo que os dois tinham de mais especial. E embalados sob o ritmo da música e da lua cantaram muitas canções. Quem observava aquele acontecimento de longe sabia que realmente era um instante especial na vida dos dois. Parecia um roteiro de cinema: anoitecer de verão, música e apaixonamento.


O rapaz, ao perceber o quanto estava envolvido por aquela atmosfera, não pensou duas vezes. Largou o violão e a beijou subitamente. Ela tomou um susto, porém não resistiu à atitude dele. Vendo esse beijo concluí que de fato estava certo acerca daquela intuição inicial. Nunca mais os encontrei, mas quando me perguntam sobre uma história de amor inusitada essa é a primeira que me vem à cabeça. Acho que poucas pessoas se conheceram de uma maneira tão singular como aquela.













sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Refletindo

Relações sempre me fazem pensar. Se eu pudesse mensurar minhas atitudes nessas relações, diria que na maioria das vezes me porto como ouvinte e conselheiro. Não é à toa que estou na profissão que estou. Porém vejo que faço isso também fora do ambiente de trabalho, acaba sendo o meu modo geral de sentir e me relacionar com o outro. Não sou daqueles que não se percebe e precisa desesperadamente do outro para enxergar-se, necessito do outro porque a alteridade sempre me desperta curiosidade e acrescenta algo na minha vida. Sinto-me confortável com quem eu sou. Claro que é uma tarefa árdua aturar-se, mas também é prazeroso descobrir seus pensamentos, saber quantas surpresas pode-se estar escondendo de si e aos poucos captá-las com alegria. Descobrir a pluralidade de cor, sons e toques que carregamos em cada pedaço de vida.

Acho que tenho a capacidade de provocar um desejo da pessoa se gostar e se procurar, como se eu encorajasse a pessoa a se ouvir, se curtir, se aceitar.

O problema desse jeito de ser é que eu acabo em vários momentos sendo vampirizado, por pessoas que precisam colocar para fora seus sentimentos, porque não encontram pessoas que as compreendam e se interessem por seus dramas. Geralmente as pessoas julgam que não tenho tantos problemas. Claro que os tenho, mas avalio que tenho poucos, comparado aos viventes que eu observo. E acho que resolvo relativamente bem os desafios que aparecem para mim.

Como qualquer ser humano eu gosto também de ter o retorno daquilo que dou e em algumas situações, geralmente no começo da ligação, me sinto frustrado de não ter a contrapartida no investimento que lancei na relação. Penso que isso acontece porque a maioria das pessoas não consegue ser compreensiva a ponto de olhar empaticamente para as questões da outra. Não posso exigir que as pessoas consigam descentrar-se e tenham a habilidade de mergulhar no mundo do outro sem sentirem-se assustadas ou contrariadas. Por isso que acabo mantendo inúmeros fragmentos de mim fora da relação, por entender que estaria falando em um dialeto incompreensível de ser decodificado naquele momento. E por acreditar que não existe ninguém melhor que eu para resolvê-los e exorcizá-los.

Sou extremamente seletivo para escolher minhas amizades, não tenho problema em confiar, tenho dúvidas mesmo a respeito da intensidade da confiança. E posso dizer que acerto em quase cem por cento das vezes. Tenho companhias extraordinárias na minha volta. Minhas relações me orgulham, pois sei que sou um pedaço de cada pessoa que confio e amo. Se você acha que sabe pouco de mim, te garanto que é porque você ainda não é capaz de me perceber e me compreender. Mas você pode ser também uma daquelas pessoas que fala tanto de si e fica tão ilhada nos seus problemas e conflitos que deve estar surpreendida ao ler esse texto.

Esse texto não é um recado para ninguém, é apenas um texto que escrevi para continuar construindo mais uma parte do meu quebra-cabeça.

sábado, 1 de janeiro de 2011

Garranchos autorais de ruptura

O que é isso? Uma mistura de emoções que me impulsiona a fazer o que estou fazendo.

Não, não, não é suicídio. De certa forma é. Chega um tempo na vida em que não concordamos mais com o que está estabelecido na sociedade. Ouvimos músicas que não nos agradam, livros que não nos dizem nada, encontros que nos frustram, lugares que não nos trazem nada novo, tarefas e profissionais que perderam a alma naquilo que fazem.

Penso que muitos chegam nesse estágio. De se cansarem do filme em que atuam. A grande diferença é quando trocamos os papéis. Deixamos de ser os figurantes para assumir o papel principal. Só que quando isso acontece, muita coisa se transforma.

Você vai ganhar responsabilidades que não tinha antes, vai ter que trabalhar duro para seguir a direção que você considera adequada. Vai ser cobrado por aqueles que começam a esperar algo de você.

Para ser quem você deseja é preciso abrir mão de vaidades e carências. É vital ter autoconfiança e obstinação. Você vai deixar de ver os outros e irá começar a se encarar com mais frequência. Os defeitos dos outros agora serão os seus. Será que você, no fundo, não era igual aos outros? Será que a sua caminhada não irá dar no mesmo lugar de inúmeros ninguéns, tão angustiados e insatisfeitos como você?

Não sei te responder. Sei de uma coisa. Um sentimento grandioso infecciona o nosso peito, nos obrigando a anunciar, não para o mundo, mas para a gente mesmo que iremos nos deslocar da marcha lenta e cega da multidão. Tenho que me desprender, me perder, não sei se me libertar, mas romper. Estar fora do centro, possivelmente excêntrico.

Porém não tenho a mínima idéia de como realizar essa empreitada. Tenho consciência que a coragem para agir é a primeira coisa que devo desenvolver. Esse é o primeiro passo. O grito inicial, o desconforto primal rumo ao conforto incerto.

Não vou mais criticar o roteiro, vou sim me municiar de objetos e “subjetos” necessários para escrever, com garranchos autorais, a minha história, semi- tardia, que há minutos atrás urrava e ardia.