terça-feira, 31 de março de 2015

Repressão transcendental


O avanço galopante da ciência nos impôs, simultaneamente, ascensão e queda. A cada dia inventamos técnicas de aperfeiçoamento do corpo e das nossas condições materiais. Por outro lado negligenciamos cada vez mais nossa dimensão transcendental. Isso acarreta muitas consequências e sofrimentos que se manifestam no cotidiano.  Engana-se quem afirma que a maior repressão ocidental se refere ao corpo. Na verdade ele é mais pervertido que reprimido. A espiritualidade é tão reprimida que é quase nula nas reflexões cotidianas. Quando surge geralmente tem um viés pragmático e finalista. A expansão de algumas religiões nos indica essa tendência. Hoje adere-se a uma crença religiosa com a esperança clara de mudança na situação material. Reza-se para ter saúde, sucesso, dinheiro e relações afetivas. A espiritualidade, como algo íntimo e singular, está definitivamente fora de pauta. Pensada como meio de nos conectarmos com uma dimensão transcendente então, nem pensar.

A espiritualidade ocidental está mais a serviço do ego do que com o objetivo de superá-lo e dissolvê-lo. Nos apropriamos dela tal qual uma ferramenta, quando ela que deveria se apropriar de nós, tomar-nos de assalto. Pode se dizer que há uma repressão de sentido maior, a nossa existência se coloca unicamente no aqui e agora, ignorando a subjetividade contida na materialidade.

Estudos científicos são desenvolvidos freneticamente para poder colocar a espiritualidade como algo válido e permitido, tirando a aura "mística" que a revestia em épocas anteriores. A espiritualidade só tem valor perante a ciência quando palpável e aplicável. Ao invés de ser um caminho possível quando nos questionamos sobre o sentido da vida concreta, somos espirituais para reafirmar que a vida é a interminável busca de obtenção de entretenimento e fruição da matéria.  Nossos hábitos e relações tornam-se ocos. O viver é uma sucessão de rituais vazios, sem um significado maior.

O biologicismo fica tão exacerbado que joga o sujeito muitas vezes para a depressão, considerada um dos males do século. As adicções são exemplo dessa repressão transcendental.  Na medida que a distração se esgota não temos muito o que fazer, parece que chegamos no fim da jornada, os sentidos estão na máxima estimulação, não há nada novo para sentir. O tédio também é um dos sintomas comuns do nosso tempo, tudo já foi feito e experimentado. Poucos se dão conta que é nesse momento que a espiritualidade grita em nosso interior, pois o externo já foi transformado de diferentes maneiras. É chegada a hora de tocarmos em algo que está muito perto, mas quase inacansável ao mesmo tempo: nossa dimensão espiritual.

sexta-feira, 6 de março de 2015

Fusão e fricção


Minha diversão é bem ou mal criar

Com a fusão dos meus demônios

E a fricção dos meus neurônios

Anarquista da vida vulgar