Lembro-me dela, e de sua promessa incansável: nunca seria
vista sem o lápis de olho. Em nenhuma ocasião sequer. Tinha alma de artista.
Exigente, temperamental, sensível e ousada. Gostava de blues e jazz, porém
sabia viver a simplicidade. Ficava bem com um vestido de alta costura da mesma
forma que uma roupa esfarrapada, daquelas talhadas para vadiar no fim de
semana. Almejava ser estilista, não sei se chegou a ser.
Tinha talento para capturar o desejo sensível, geralmente
submerso nas tramas do cotidiano.Transava com instinto de predadora, mas sem
nunca perder a sensualidade e a pose. Nutria sonhos pré-industriais, apesar da
imagem pós –moderna. Buscava se perder na efervescência cultural, queria
experimentar o lado dionisíaco da arte e sugar ao máximo os aprendizados de
cada olhar que lhe atravessava.
Demonstrava momentos infantis, nos quais fazia expressões de
insatisfação frente ao não atendimento dos seus desejos. Tinha a curiosidade
que tirava do eixo quem não ousava se aventurar no novo. Aparentava ser frágil,
mimada e defensiva, mostrando suas unhas e olhares felinos para estranhos, que
não conseguiam desvendá-la. Agia com impaciência, deixando para trás quem não
sacasse com rapidez onde ela queria chegar.
Era uma eterna vaidosa, se despindo da sua imagem apenas
quando necessário. Passava a impressão de viver em sofrimento intenso, quem
sabe por perceber a feiúra de muitas opressões do dia-a-dia. Queria um universo
estético e frugal, no qual sua feminilidade se registraria na sua maior
potência. Uma fêmea sonhadora, que se alimentava de poetas e afetos exaltados,
uma dama que não temia libertar sua porção voraz. Um ser envolvente e marcante.
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